fevereiro 11, 2009

SAÍMOS MELHORES


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René Dioz



Há muitas coisas para se fazer num final de semana. Dormir, ver tevê, usar a internet, ficar com a família, comprar, ler, pagar contas, tomar banho de cachoeira, dançar, transar, cantar, comer. E também refletir. No último final de semana, no domingo, depois do encerramento do Curso de Formação Política e Sindical, organizado pelo Sindicato dos Jornalistas de Mato Grosso (SIndjor-MT), que nos "roubou" o sábado quase todo e o domingo pela metade, me senti feliz. O que cortava meu coração não era mais a ansiedade de oferecer bons e importantes momentos para os inscritos, algo que despertasse consciências. O que cortava o meu coração era uma brisa, uma sensação muito boa, de passo dado, e aproveito para agradecer a cada pessoa que esteve presente, com sua fala ou com seu silêncio, por ter participado por todo o tempo ou pelo tempo que pôde. Aproveito ainda para nos desculpar de qualquer falha e é nesse sentido também que vai este e-mail. Comentem, por favor, o que gostaram e o que não gostaram no curso. Isso é fundamental. Sem travas, viu? Para que possamos melhorar sempre. E saímos melhores desse curso? Respondo que sim.


Quando terminou tudo, ainda não havia terminado. Ficamos um tempão assentados, sob a sombra de uma árvore, do jardim da Adufmat, onde aconteceu o curso. Aliás, que lugar gostoso! Um papo fluiu. Éramos 11, dos 32 que nos deram a felicidade da esperança, comparecendo, nos ajudando a fazer as reflexões necessárias. E uma pergunta ainda me zuni na cabeça desde aquele papo. A questão é a seguinte: o que passa na cabeça dos jornalistas? Esses mesmos que sofrem com salários baixos, salários atrasados, assédio moral, pressão, censura, sobrecarga, duplicidade de cargos? Esses que não se aproximam do sindicato, de uma forma direta, apesar de sentirem na pele o drama do trabalhador da imprensa? Seria apenas o medo de perder o emprego? Isso por si só não é pouca coisa. Muitos de nós temos família para sustentar, filhos, temos também de sustentar a nós mesmos. Seria por se alinhar com o pensamento ideológico da hora e estar ajustado ao capitalismo, aquele que dá com uma mão e tira com a outra, em seguida, no círculo vicioso do "recebe salário – paga contas – não sobra nada"? Seria por que? Por que? Por que? É uma pergunta que precisa ser respondida.


É preciso pensar nisso gente. Só assim nossa rede se fortalece. Não condenar o outro, que, por motivos diversos, ainda não se vê como trabalhar, apesar de sofrer as conseqüências disso no dia-a-dia. Mas sim orientá-lo, convencê-lo de que é preciso luta, mobilização, união, defesa e força, como propuseram os que participaram de uma brincadeira, durante a mesa "Sindicalismo no Brasil e no mundo – Sindicato pra que?", orientada pelo professor de História, Robinson Ciréia.


Só assim conseguiremos travar uma campanha salarial com bons frutos este ano. Ano passado, apesar do desgaste das reuniões todas, do enfrentamento aos patrões, a TV Centro América conseguiu desarticular nosso acordo quase fechado com os outros três grupos dos quatro que chamamos para negociar a vida dos trabalhadores da imprensa, Folha do Estado, Gazeta e Diário de Cuiabá. E na palestra de Francisco Faiad, "Os caminhos jurídicos para os trabalhadores", o advogado do Sindjor e presidente da Ordem dos Advogados do Brasil deixou claro que, por não termos acordo com os patrões, nossa única chance este ano é mostrarmos que temos condições de ameaçar com uma greve, caso se recusem a negociar conosco, abrindo a possibilidade de irmos ao dissídio. Precisamos ainda conquistar colegas que hoje estejam na posição de patrões, para que puxem construção de uma entidade patronal, seria mais fácil lidar de sindiato para sindicato. Também na palestra do Faiad, ficou claro que podemos, e devemos, ser mais ofensivos pelo meio jurídico. Então, os intratáveis, este ano, serão mais questionados na justiça. Essa mesma justiça contraditória, que muitas vezes tende pelo lado do patrão.


É soturno o cenário? Sim, é. Um amigo sempre diz que há mais distorções no mundo do trabalho do que julga nossa vã filosofia. Mas há muitos caminhos, que não são só jurídicos, para tocar nossas idéias adiante. A oficina "Como fazer um projeto e captar recurso", orientada pela produtora cultural Keiko Okamura, nos abriu possibilidades. Tentaremos fortalecer assim o coral Na Boca do Povo, a Sessão Pipoca à Brasileira e o Movimento Jornalistas na Favela, três projetos sociais do Sindjor-MT.


João Negrão e Martha Baptista, dois jornalistas experientes, nos ajudaram, cada um a seu modo, a perceber, o primeiro, a linha histórica das comunicações e, Martha, as relações de poder nessa mídia.


O professor Dorival Gonçalves Júnior, doutor em energia pela Usp, professor da UFMT, militante histórico, suou literalmente a camisa, apesar do bom ar condicionado, demonstrando empolgação para explicar aos jornalistas que crise é essa que já nós alcança no cangote. E ficou claro que essa crise é dos empresários, dos banqueiros, dos donos do dinheiro. E ficou claro também que os trabalhadores já vêm arrastados em outras crises há tempos, mas ninguém pensa em socorrê-los. No entanto agora, são eles e o Estado – o tão criticado Estado pelos liberais – que são chamados para salvar a "pátria" dos endinheirados.


Teve jornalista que chorou quando assistiu ao filme "Ilha das Flores", de Jorge Furtado, em que o ser humano é colocado em situação mais degradante do que a de porcos, se alimentando de lixo, em nome do lucro.


Na mesa dos movimentos populares, Solange Sarafim disse que há 11 anos milita no MST e que não há como mais a imprensa denegrir de tal modo o Movimento. Quem se aproxima, diz ela, se surpreenderá com homens e mulheres simples, que querem viver na roça e não na cidade. Uma imagem bem diferente da estampada nos jornais e tevês. Trocando em miúdos políticos, reforma agrária é solução e não problema, para o país. Resolveria parte da violência urbana. Mas para o latifúndio, claro que isso é uma afronta. Ou alguém pensa que um fazendeiro vai querer afastar a cerca, deixar de faturar, para colaborar com a nação? Na mesma mesa, o DJ Taba, do Movimento Favelativa, explicou que levou tempo para perceber que há jornalistas bem intencionado, embora estejam sufocados pelo sistema, e que hoje procura por eles, para tentar que sejam retratadas as mazelas da periferia de Cuiabá.


O que andam ensinando nas faculdades de jornalismo? O professor Ailton Segura, jornalista, efetivo da UFMT, responde. "As faculdades não estão cumprindo seu papel", reconhece. O conhecimento técnico, pensa ele, se aprende rápido, mas não a mística da profissão. Com isso quer dizer que ser jornalista é mais que saber escrever. E é preciso ensinar isso.
Sindicatos e movimentos sociais compareceram para discutirmos sobre o nosso papel, longe dos nossos umbigos e mais próximos da sociedade.


Foram muitos momentos legais, inenarráveis. Não tenho a pretensão de que esse texto seja como uma ata. A gente riu e pensou. Tomamos cafezinhos e almoçamos juntos. Na minha terra, Minas Gerais, a gente sela a amizade assim, numa mesa posta. A gente pode até não dar conta de arregaçar as mangas agora. Mas não tem como esquecer o que ouvimos. E isso me dá a certeza, a clareza, de que saímos, sim, melhores desse curso de formação.
Não se esqueçam de comentar, criticar, elogiar.


Saudações


Keka Werneck

Presidente do Sindjor-MT

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