março 05, 2012

A visita do crack, a droga da morte


Por DJ Taba da Silva
Hoje recebi a visita da mãe de um amigo que é viciado em crack, um mau que, na minha opinião, tem que ser combatido profundamente e seriamente por todos nós, digo todos porque temos o costume de culpar sempre alguém pelos desconsertos da nossa sociedade. E sempre, sim, o culpado é o governo, o culpado é o viciado, o culpado é o bairro onde moramos, enfim, mas não paramos para refletir o que nós mesmos estamos fazendo para mudar esta realidade, que está em nossa frente e às vezes ignoramos a por ser hoje tão comum. Assim vivemos sempre pensando que isso não tem nada a ver comigo.
Quero esclarecer uma coisa: não sou careta ou preconceituoso, nem mos um religioso radical. Me considero mais um sobrevivente do gueto cheio de defeitos e talvez algumas qualidades mais nunca superior a ninguém talvez por isso sou procurado por moradores que acreditam que de alguma maneira eu posso ajudar e só isso.
O fato é que o crack não tem mais como ser ignorado, é só dar uma volta pela cidade e não precisa mais ser em horários noturnos como antes, hoje em plena luz do dia você vê viciados da pedra (apelido dado ao crack), andando pelas ruas em busca de uma vítima ou em consumo frenético da substância.
Lembro em rodas de amigos quando brincávamos dizendo: – Olha lá fulano, já vai beijar na boca da latinha. Na que época, quando eu ainda era adolescente, não sabíamos o mal que isso seria para a nossa comunidade. Mas já percebíamos que, quando fulano ia fazer uso do crack, já não voltava mais aquela noite, pois o consumo o consome. Daí um dos motivos que me preocupava e me manteve distante da droga.
Aqui em Mato Grosso existe uma particularidade ou, invés de ser feito de cocaína e outros solventes, é feito com pasta base, o lixo da cocaína o que o torna ainda mais devastador.
Segundo pesquisa realizada pela Secretaria Municipal de Assistência Social de Cuiabá, o bairro do Porto (na orla, debaixo da ponte e na Praça Major João Bueno), a região do Terminal Rodoviário de Cuiabá, o Centro (Beco do Candeeiro e Centro Histórico de Cuiabá) e os bairros Jardim Leblon e Pedregal, é aonde o bicho tá pegando, considerados as cracolândias de Cuiabá. Mas onde moro, Jardim Vitória não é diferente e nós estamos sendo sufocados aos poucos.
Estou citando as pesquisas porque há pessoas extremamente científicas e isso as deixa menos sensíveis, então já que precisam de números, eles estão aí.
A mesma pesquisa aponta outros 28 bairros da capital na mesma situação. O que me faz pensar quantas mães como a dona Sara (nome fictício) estão em pranto hoje? Ou porque seu filho está furtando da própria casa o pão de cada dia, ou por estarem nas ruas mendigando em busca de mais um beijo na latinha, o crack?
Dona Sara me disse que não suporta mais esta situação, que o filho dela está sem nenhuma roupa para usar por que pegou até as dela para trocar pela droga. Ela me disse que ela está saindo de casa e vai abandoná-lo. Agora imagina para uma mãe largar o filho o que ele já não aprontou. São sete anos tentando tirar o filho da crack. Ela me disse também que o último prejuízo foi de dois mil reais, contando com as mercadorias que ela vende de porta em porta para se sustentar. Dramática situação. Na moral, me encho de um sentimento estranho um misto que é melhor não tentar explicar. E você deve estar pensando que é sentimentalismo, ou pura polêmica e demagogia.
Então vamos lá, tenho um irmão adicto e, para quem não sabe o que significa adicto, é como são chamados os dependentes de química. Ele me disse que está sempre em recuperação, freqüenta reuniões toda semana e até coordena uma reunião todos os domingos para se manter limpo, distante do vício.
Convivemos com esta situação em casa ou na família por seis anos, sei bem o que a dona Sara e muitas outras famílias no Brasil estão passando, acredito que estamos em um patamar como jamais antes e, se não tomarmos atitudes para combater o crack, corremos riscos de perder ainda mais crianças, trabalhadores e trabalhadoras.
Antes há um tempo atrás, o crack só atingia as grandes cidades, mas já sabemos que está no interior, na zona rural e até mesmo em aldeias indígenas substituindo o álcool e desmantelando famílias.
Temos que tomar atitudes como tomarão os presídios de Cuiabá. Você está se perguntando: como assim os presídios? Os ladrões e traficantes? Não estou entendendo. Vou explicar. Talvez possa ser uma boa notícia, depende da compreensão de cada um ou cada uma. Há quase seis meses está proibido o consumo e venda de crack no interior dos presídios Pascal Ramos e Carumbé. Para mim já e uma atitude tomada por aqueles que estão à margem, pagando de forma subumana sua dívida com a sociedade.
Parece repetitivo mas você pode estar se perguntado: mais no presídio tem droga? Vou te responder, não sei! Só sei que está proibida pelos próprios detentos, diga-se de passagem.
Temos tido campanhas governamentais e no ano passado o Movimento Favelativa, instituição da qual participo, foi premiada na Semana Estadual de Combate as Drogas, um evento lindo. Parabéns ao Conselho Estado de Entorpecentes (Conem-MT) pelo evento que este ano, acredito eu, deve ser mais descentralizado e haver ainda mais participação popular, pois estamos combatendo um mostro, uma doença epidemia que tem que ser combatida não de forma pontual mais sim antes, durante e depois.
O Governo Federal anunciou investimentos no valor 4 bilhões no combate ao crack e as nossas ruas estão cada vez mais lotados de viciados, enquanto grupos que trabalham na prevenção com cultura, arte e as clínicas de recuperação, na real, estão com extremas dificuldades.
Temos que ter meios de fiscalizarmos o investimento. A sociedade organizada e seria, tem que participar mais destes recursos, porque está claro que os estados e prefeituras não estão conseguindo sozinhos combater este mal.
Quero me aprofundar ainda mais no assunto, pois acredito que todos nós temos que fazer a nossa parte debatendo, conversando com as crianças, usando as redes sociais, nos mobilizando contra o crack.
Para finalizar, convido a todos para conhecerem a sala do NA Narcóticos Anônimos que está estalada no Centro Cultural Favelativa, na esquina com Avenida B, rua 9, bairro Jardim Vitória, Cuiabá. Todos que lá chegarem serão muito benvindos .
Este é meu desabafo. Muitos estão morrendo e muitos vão morrer se a gente continuar achando que nada podemos fazer.
Pense nisso.
DJ Taba da Silva é liderança comunitária e do Movimento Favelativa, no bairro Jardim Vitória, periferia de Cuiabá

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